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Um outdoor dúbio e reflexões sobre faltas

Falta acessibilidade e falta cautela do comunicador

Numa rua movimentada de Indaiatuba, me deparei com um outdoor. Ele (ou pelo menos o que enxerguei dele) era assim: do lado esquerdo, um desenho de uma criança gritando em um megafone. À direita, um longo texto seguido de alguns logos institucionais.

Com meu mísero 1 grau e meio 5 de miopia e um leve astigmatismo em um dos olhos, pude ler os seguintes dizeres: “NÃO… DENUNCIE”. Essas eram as palavras destacadas em vermelho

Me aproximei.

A surpresa: o cartaz conscientizava (ou tentava conscientizar) sobre trabalho infantil, pedindo para que se denunciasse tal atividade ilegal.

Outdoor em Indaiatuba tem leitura difícil e pode causar desentendimento

Diga não ao trabalho infantil. Denuncie! Disque 100.

Esse era o texto completo.

Pensei em muitas coisas nos minutos que parei minha caminhada para encarar a peça. O que me convém, porém, é falar sobre a acessibilidade visual e o bom senso do comunicador.

Nos meus saudosos anos de faculdade, quando trabalhava ativamente com acessibilidade visual, dois pontos que meus colegas e eu enfatizávamos no final dos treinamentos e capacitações sobre o tema eram:

  1. Todos podem se beneficiar da acessibilidade. Sim, o público primário da acessibilidade visual são as pessoas que enfrentam barreiras relacionadas a esse sentido: pessoas cegas, pessoas com baixa visão, daltônicos etc.. Porém, há outras condições e contextos que interferem na percepção visual: pessoas com dislexia, pessoas neurodivergentes e até pessoas estressadas, desatentas, com pressa, entre outras.
  2. O primeiro passo para aplicar acessibilidade na comunicação é o bom senso. Tipografia, teoria das cores, contraste etc.. são aspectos fundamentais para tornar o texto visual/escrito mais compreensível e, com um olhar atento, faz-se escolhas mais acessíveis, mesmo sem conhecer profundamente sobre o tema.

Daí a máxima: o comunicador precisa usar seu bom senso. Quando me deparei com o outdoor que me confundiu, além da acessibilidade, lembrei das regrinhas sobre mídia: uma mensagem deve ser adaptada para cada canal em que será comunicada e deve considerar o contexto do público. Aprendemos que o outdoor comunica preferencialmente a quem está no trânsito. Por isso, deve conter mensagens curtas e claras.

Alguns dos possíveis ajustes cabíveis ao outdoor em questão, em termos de comunicação e acessibilidade, envolvem:

  • Excesso de texto escrito;
  • Tamanho da fonte;
  • Escolha dos termos em evidência;
  • Relevância da combinação entre o texto e a imagem…

É claro que no dia-a-dia corrido do trabalho com comunicação, alguns detalhes podem passar despercebidos. Mas temos delicados merecem um duble-check.

De qualquer maneira, se a acessibilidade fosse considerada na execução da peça, ambiguidades como a que me deparei hoje provavelmente não ocorreriam. E se a prevenção de ambiguidades fosse considerada na execução da peça, provavelmente ela seria mais acessível.